quinta-feira, 20 de maio de 2010

Se você vai concorrer, prepare-se

Se você decidiu que vai concorrer a um cargo público na eleição deste ano, está mais do que na hora de dar início à preparação da campanha e de sua candidatura. Tudo o que puder ser feito agora é tempo precioso que você está economizando para o contato direto com os eleitores. Há inúmeras providências que podem ser tomadas desde já e que são indispensáveis para trabalhar sem maiores sustos e sobressaltos.

Ponha em ordem sua documentação

Há certos documentos que você deve ter à mão quando começar a campanha. Provavelmente você não vai precisar usá-los. Mas nunca se sabe. Procurar documentos com a campanha em andamento é perda de tempo, é acréscimo de stress e é arriscado politicamente. Assim, suas declarações para o Imposto de Renda, por exemplo, devem estar à disposição e atualizadas. O mesmo vale para os papéis relativos à propriedade de seus bens. Não esqueça daquele terreno na praia, aonde você nunca vai, mas que o adversário pode descobrir e usar como prova de que você esconde suas propriedades.


Reúna toda documentação que regularize sua situação caso você tenha se envolvido num acidente de trânsito

Multas de trânsito e documentos que registram a ocorrência de acidentes de carro também devem estar com a quitação comprovada - e as questões relativas ao fato muito bem esclarecidas, sobretudo se houve lesões corporais. Se você tiver algum processo em andamento, é sempre melhor imaginar que ele será usado contra você. Aqui, todo cuidado é pouco. Politicamente, os piores são processos criminais, financeiros e trabalhistas. Peça ao seu advogado para reunir a documentação que você precisaria em caso de o assunto ser levantado na campanha. Faça cópias e guarde consigo a sete chaves.

Há muitos outros documentos que você deverá checar, como carteira de motorista vencida, pagamentos de impostos em dia, etc. O princípio é o mesmo para todos os casos: você não pode ser surpreendido durante a campanha por uma situação em que você precise do documento naquela hora e não o tenha à mão.

Ponha em ordem suas finanças

As razões para esta preocupação e às providências que deve tomar nesta fase anterior à campanha são as mesmas. As finanças pessoais costumam ser o calcanhar-de-aquiles de um político em campanha. Não somente dívidas, financiamentos, empréstimos e investimentos devem estar plenamente documentados com você, mas também outras despesas como viagens, compras de carro, reformas na sua casa etc. Não esqueça jamais que, como candidato, você é uma pessoa pública e seu direito à privacidade ficou muito limitado. Assim, seu padrão de gastos e de propriedades devem estar em consonância com a declaração de bens que você faz junto à Justiça Eleitoral.

Além disso, programe-se financeiramente com antecedência porque uma campanha sempre vai envolver despesas pessoais - e você deve estar preparado para enfrentá-las. Mais que isso, haverá momentos em que você terá de avalizar custos na expectativa do ingresso de contribuições. Se elas se consumarem, tudo bem. Se não, você terá que pagar as dívidas. Faça uma estimativa de quanto você pretende - ou pode - gastar na campanha com recursos próprios e depois acrescente pelo menos 50% sobre tal valor.


Ponha em ordem seu corpo

Uma campanha eleitoral implica grande desgaste físico e um potencial desequilíbrio de seu organismo. Seus hábitos de lazer, alimentação, sono, bem como o nível de stress com o qual você está acostumado a viver serão todos radicalmente alterados. Se você está obeso ou acima do peso, é hora de emagrecer. Você tem ainda algum tempo pela frente para fazer uma dieta eficiente e sem sacrifícios exagerados. Se está fora de forma, é hora de fazer exercícios - correr, caminhar - para poder enfrentar a maratona da campanha em boas condições. É também um bom momento para fazer um check up.


Se você está acima do peso, aproveite para começar uma boa dieta

Na campanha você vai ter que subir muitas escadas, caminhar bastante, andar sob a chuva, usar e abusar de sua voz em todas as situações de temperatura e clima, dormir tarde e acordar cedo - para citar algumas das provas a que terá que se submeter. Você não vai querer aparecer ofegante diante dos eleitores depois de subir alguns lanços de escada; suando após uma caminhada; com dores pelo corpo que o obriguem a procurar uma cadeira; com olheiras por não dormir o suficiente ou, o que é ainda pior, cochilando durante reuniões e encontros.

Como candidato, você não é obrigado a ser um atleta, mas precisa estar em muito boa forma. É certo que aquela escada vem depois de um dia inteiro de caminhadas, subidas, falar em pé, de um resfriado que se insinua etc. Mas para quem esperou por uma oportunidade, aquele é o primeiro contato do dia com você. Se parecer cansado, nervoso, desanimado, distraído, malvestido, vai decepcionar as pessoas e alimentar dúvidas quanto a sua disposição, capacidade de vencer, seu entusiasmo, sua juventude e, até, sua saúde.

Organize sua agenda para assegurar momentos de repouso, conforme suas necessidades, sua idade, sua compleição física, seu estado geral. Mas, quando aparecer para os eleitores, trate de mostrar o melhor de você: animado, disposto, bem vestido, atento a tudo e a todos, incansável na busca de cumprimentar e conversar com todos que puder, eloquente, confiante na vitória, transmitindo, com palavras e comportamento, confiança e entusiasmo.

Uma palavra final: Evite comer enquanto estiver em alguma atividade de campanha. Você comerá demais - e comerá o que não deve. Faça de conta que come, mas deixe para se alimentar de verdade dentro de um esquema próprio de horários e de cardápios. Beba somente água. E solte logo o copo. Não o fique segurando, não seja fotografado com copo na mão, mesmo que seja refrigerante.


Dê uma forma definitiva ao seu currículo

Seu currículo é sua biografia resumida, a base de sua imagem e o registro de suas credenciais para o cargo que pleiteia. Não é, pois, assunto que se trata com desleixo. Um erro factual pode ser explorado como mentira, como deturpação que lhe favorece ou como evidência de sua falta de credibilidade. Basta lembrar a controvérsia que envolveu Ciro Gomes na eleição presidencial de 2002. Um descuido do candidato fez com que se atribuísse dois ou três anos a mais de frequência à escola pública do que ele efetivamente cursou. Imprudência aparentemente irrelevante. Aparentemente... Explorada por seus adversários, fez com que Ciro tivesse que gastar minutos preciosos do tempo na TV para se explicar.

O currículo para a campanha deve ser elaborado com todo cuidado. Não deve omitir nada de importante - ou os adversários se encarregarão de completá-lo durante a campanha - e não deve estender nenhuma realização além do que efetivamente ocorreu - se você não chegou a terminar aquele curso, embora tenha dele participado intensamente até o fim, não estique esta informação, dizendo que fez o curso. As regras fundamentais são a sinceridade, a verdade e a precisão. Você não está obrigado, entretanto, a dar conta de cada ano de sua vida, tampouco informar itens absolutamente irrelevantes à disputa e ao cargo.


A ida de Lula a São Paulo, a bordo de um pau-de-arara, foi contada pelo atual Presidente nas eleições de 2002

Um currículo é sempre construído com um objetivo em mente. Assim, as realizações que recomendam uma pessoa para um concurso público ou para um emprego numa empresa não são necessariamente as mesmas que vão interessar o eleitor. Sem mentir e distorcer, você deve fazer uma seleção criteriosa de seu passado, valorizando mais aquelas informações que o credenciam para o cargo. O ideal, do ponto de vista eleitoral, é que o currículo contenha uma história na qual obviamente você é o protagonista. Algo que facilite sua identificação com o eleitor e que contenha os atributos de um conto: enredo e personagens capazes de dar consistência a uma narrativa interessante.

Na eleição presidencial de 2002, Lula contou a história de sua vida como uma narrativa dramática - o nascimento em Pernambuco, a viagem no pau-de-arara para São Paulo, os primeiros empregos, o acidente que provocou a perda do dedo, a família que constituiu, a experiência como líder sindical, a batalha para criar o PT, as disputas presidenciais. A história pessoal contada assim é sempre atrativa. As pessoas têm curiosidade sobre a vida de famosos e importantes e a narrativa é uma fórmula que encontra ressonância no eleitor, que com ela está familiarizado desde criança.

Atenção! Se você tem uma história de vida que pode ser apresentada como uma narrativa ou que contenha um episódio que possua tais características, use-a. Vai tornar muito mais fácil a aceitação de sua candidatura pelos eleitores. Mas se você não tem, não invente uma. Forjar uma biografia para favorecê-lo é um ato que o eleitor não perdoa - e que o adversário explora até o seu último limite.


Preparar-se para a eleição é atualizar-se

A atual fase é o momento próprio para você preparar-se para a campanha sob o ângulo intelectual. Nada na política tem evoluído com maior rapidez e profundidade do que a tecnologia da campanha eleitoral. Você precisa tomar conhecimento destas técnicas que estão a seu alcance. Todos, mesmo os políticos mais experientes, têm muito a aprender - e muito mais a reformular - na forma como conduzem suas campanhas.

Não pense que campanha moderna é sinônimo de campanha rica. A campanha moderna está ao alcance de todos, desde que os candidatos se deem ao trabalho de conhecê-la e praticá-la. Pesquisa, estratégia e marketing constituem o núcleo central da campanha moderna. Mais ainda que a campanha rica, a pobre depende da tecnologia para compensar com o cérebro e o coração o que carece de recursos.


A tecnologia dotou as campanhas eleitorais de mecanismos mais precisos na hora de definir estratégias

Produção de material gráfico, mala-direta, o uso do telefone, os próprios e clássicos corpo-a- corpo e porta-a-porta, o rádio, o trabalho de voluntários, a TV, a técnica da segmentação, os meios de adquirir informação confiável, a administração da agenda, os princípios estratégicos e erros mais comuns que se cometem constituem um corpo de conhecimentos sólido - e, em muitos casos, comprovado por pesquisas científicas - que não pode ser ignorado. Todos estes itens e outros mais foram profundamente alterados na tecnologia da moderna campanha eleitoral, com vistas a torná-los mais eficientes e produtivos. Você não vai querer se arrepender por ignorá-los. Esta é a hora certa para se atualizar.

Atenção à estratégia

Neste momento, você se encontra ainda a meses da data da eleição. Se você deu atenção às advertências feitas anteriormente, a algumas providências você já deu andamento - regularização de documentos, das finanças, da condição física, do currículo, do estudo e da atualização. Não se supõe aqui que tudo nessas áreas já está resolvido, mas que estão em andamento. Estudo e atualização, por exemplo, são atividades permanentes. Regularização da documentação às vezes exige mais tempo etc. Portanto, algumas coisas estão feitas e em andamento. É, pois, o momento de começar outras de natureza mais complexa. Começa agora a sua preparação estratégica para a campanha, que se desdobra em:

  • Posicionamento da candidatura
  • Formatação da comunicação publicitária
  • Timing
  • Segmentação do eleitorado
  • Organização do trabalho de campo

Atenção! É imprudente deixar tais questões para mais tarde, já que você dispõe de tempo agora. Mas não incida no erro oposto: o de pretender equacioná-las definitivamente agora. Trata-se de começar as tarefas. Elas demandarão ainda algum tempo para serem finalizadas. Começando agora, você ganha tempo precioso, mas não há como finalizá-las neste momento. Falta ainda a atmosfera política que a maior proximidade da campanha traz, assim como faltam os adversários e, sobretudo, a atenção mais focada e o interesse definido do eleitor pela campanha.


Essas são tarefas, entretanto, que você não conseguirá realizar sozinho. Antes de empreendê-las, você já deve ter constituído o seu estado-maior, isto é, aquelas pessoas cuja confiança, lealdade, experiência e conhecimento as credenciam para assessorá-lo na campanha. A constituição dessse grupo é um desafio a sua capacidade de selecionar as pessoas certas para as funções adequadas. Algumas delas, talvez, já o assessoram há mais tempo. Outras começarão a integrar sua equipe a partir de agora. Devem constituir um grupo capaz de trabalhar bem coletivamente, secundarizando vaidades e interesses individuais pelo objetivo maior de ganhar a eleição.

Campanhas eleitorais costumam atrair egos fortes e afirmativos, líderes nos seus campos específicos de atuação. O reconhecimento do mérito e o prêmio à competência são sempre a aprovação do candidato. Dessa situação decorre um certo grau de competitividade entre os membros que, mantido dentro dos limites fixados pelo objetivo maior de ganhar, é positivo. Extrapolar tais limites, entretanto, tornando-se uma rivalidade pessoal, é altamente destrutivo.

Ciência e arte a serviço da estratégia


A equipe de campanha precisa saber trabalhar coletivamente rumo à vitória

Além do potencial desentendimento entre os membros mais próximos do candidato, há também os fatos de natureza política e estratégica. A definição da estratégia é sempre o resultado da ciência e da arte. A ciência, sobretudo a pesquisa, leva a equipe com segurança,até um certo ponto. A partir dali, é obra da criatividade, da imaginação e do talento. Trata-se de uma criatividade que se erige sobre fundamentos sólidos do conhecimento confiável, mas a formatação final da estratégia, sua linha de comunicação com o eleitor, é obra da arte: da imagem bem escolhida, das frases bem apanhadas; da história narrada de forma atraente; da sintonia com o sentimento do eleitor; do slogan, do jingle e da marca que aderem ao candidato e o identificam para o eleitor; das propostas apresentadas com clareza e persuasão; das cores, do movimento e do ritmo das peças publicitárias.

Por isso, insistimos tanto na capacidade de a equipe saber trabalhar junto, respeitar-se e não permitir jamais que a brilhatura pessoal, a vaidade e a competição interna adquiram mais importância que o objetivo de vencer. A equipe que você vai formar terá seus cientistas (pesquisa), seus teóricos (estrategistas) e seus artistas (publicitários). Todos devem saber quais são seu momento e seu limite. Como regra, o trabalho científico – pesquisa e segmentação do eleitorado - vem antes. Sua tarefa é definir com clareza qual é a mensagem certa para o eleitorado certo. Ou seja, a mensagem da candidatura que corresponde aos sentimentos e prioridades do eleitor - e qual eleitor pode vir a votar em você.

Definida essa questão, a publicidade se encarrega de formatar a mensagem de maneira a dotá-la da capacidade de comunicação. É mediante a propaganda que a mensagem certa chega aos eleitores certos, de forma atraente, envolvente e persuasiva. Esse é um trabalho muito mais da arte que da ciência. A separação da elaboração estratégica entre as duas significa que publicitários podem dar idéias e ter o que dizer sobre as pesquisas, assim como os estrategistas e pesquisadores também sejam ouvidos sobre a comunicação. Se a equipe trabalha bem em grupo, têm-se muito a ganhar com esta fertilização cruzada.

Atenção! A penúltima palavra sobre um campo e outro pertence aos respectivos especialistas. A última palavra deve sempre ser a sua. São cuidados que podem parecer excessivos. Esteja, entretanto, certo de que não o são. Ao contrário, constituem um investimento seguro na eficiência de sua campanha.


Francisco Ferraz

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