quinta-feira, 20 de maio de 2010

Se você vai concorrer, prepare-se

Se você decidiu que vai concorrer a um cargo público na eleição deste ano, está mais do que na hora de dar início à preparação da campanha e de sua candidatura. Tudo o que puder ser feito agora é tempo precioso que você está economizando para o contato direto com os eleitores. Há inúmeras providências que podem ser tomadas desde já e que são indispensáveis para trabalhar sem maiores sustos e sobressaltos.

Ponha em ordem sua documentação

Há certos documentos que você deve ter à mão quando começar a campanha. Provavelmente você não vai precisar usá-los. Mas nunca se sabe. Procurar documentos com a campanha em andamento é perda de tempo, é acréscimo de stress e é arriscado politicamente. Assim, suas declarações para o Imposto de Renda, por exemplo, devem estar à disposição e atualizadas. O mesmo vale para os papéis relativos à propriedade de seus bens. Não esqueça daquele terreno na praia, aonde você nunca vai, mas que o adversário pode descobrir e usar como prova de que você esconde suas propriedades.


Reúna toda documentação que regularize sua situação caso você tenha se envolvido num acidente de trânsito

Multas de trânsito e documentos que registram a ocorrência de acidentes de carro também devem estar com a quitação comprovada - e as questões relativas ao fato muito bem esclarecidas, sobretudo se houve lesões corporais. Se você tiver algum processo em andamento, é sempre melhor imaginar que ele será usado contra você. Aqui, todo cuidado é pouco. Politicamente, os piores são processos criminais, financeiros e trabalhistas. Peça ao seu advogado para reunir a documentação que você precisaria em caso de o assunto ser levantado na campanha. Faça cópias e guarde consigo a sete chaves.

Há muitos outros documentos que você deverá checar, como carteira de motorista vencida, pagamentos de impostos em dia, etc. O princípio é o mesmo para todos os casos: você não pode ser surpreendido durante a campanha por uma situação em que você precise do documento naquela hora e não o tenha à mão.

Ponha em ordem suas finanças

As razões para esta preocupação e às providências que deve tomar nesta fase anterior à campanha são as mesmas. As finanças pessoais costumam ser o calcanhar-de-aquiles de um político em campanha. Não somente dívidas, financiamentos, empréstimos e investimentos devem estar plenamente documentados com você, mas também outras despesas como viagens, compras de carro, reformas na sua casa etc. Não esqueça jamais que, como candidato, você é uma pessoa pública e seu direito à privacidade ficou muito limitado. Assim, seu padrão de gastos e de propriedades devem estar em consonância com a declaração de bens que você faz junto à Justiça Eleitoral.

Além disso, programe-se financeiramente com antecedência porque uma campanha sempre vai envolver despesas pessoais - e você deve estar preparado para enfrentá-las. Mais que isso, haverá momentos em que você terá de avalizar custos na expectativa do ingresso de contribuições. Se elas se consumarem, tudo bem. Se não, você terá que pagar as dívidas. Faça uma estimativa de quanto você pretende - ou pode - gastar na campanha com recursos próprios e depois acrescente pelo menos 50% sobre tal valor.


Ponha em ordem seu corpo

Uma campanha eleitoral implica grande desgaste físico e um potencial desequilíbrio de seu organismo. Seus hábitos de lazer, alimentação, sono, bem como o nível de stress com o qual você está acostumado a viver serão todos radicalmente alterados. Se você está obeso ou acima do peso, é hora de emagrecer. Você tem ainda algum tempo pela frente para fazer uma dieta eficiente e sem sacrifícios exagerados. Se está fora de forma, é hora de fazer exercícios - correr, caminhar - para poder enfrentar a maratona da campanha em boas condições. É também um bom momento para fazer um check up.


Se você está acima do peso, aproveite para começar uma boa dieta

Na campanha você vai ter que subir muitas escadas, caminhar bastante, andar sob a chuva, usar e abusar de sua voz em todas as situações de temperatura e clima, dormir tarde e acordar cedo - para citar algumas das provas a que terá que se submeter. Você não vai querer aparecer ofegante diante dos eleitores depois de subir alguns lanços de escada; suando após uma caminhada; com dores pelo corpo que o obriguem a procurar uma cadeira; com olheiras por não dormir o suficiente ou, o que é ainda pior, cochilando durante reuniões e encontros.

Como candidato, você não é obrigado a ser um atleta, mas precisa estar em muito boa forma. É certo que aquela escada vem depois de um dia inteiro de caminhadas, subidas, falar em pé, de um resfriado que se insinua etc. Mas para quem esperou por uma oportunidade, aquele é o primeiro contato do dia com você. Se parecer cansado, nervoso, desanimado, distraído, malvestido, vai decepcionar as pessoas e alimentar dúvidas quanto a sua disposição, capacidade de vencer, seu entusiasmo, sua juventude e, até, sua saúde.

Organize sua agenda para assegurar momentos de repouso, conforme suas necessidades, sua idade, sua compleição física, seu estado geral. Mas, quando aparecer para os eleitores, trate de mostrar o melhor de você: animado, disposto, bem vestido, atento a tudo e a todos, incansável na busca de cumprimentar e conversar com todos que puder, eloquente, confiante na vitória, transmitindo, com palavras e comportamento, confiança e entusiasmo.

Uma palavra final: Evite comer enquanto estiver em alguma atividade de campanha. Você comerá demais - e comerá o que não deve. Faça de conta que come, mas deixe para se alimentar de verdade dentro de um esquema próprio de horários e de cardápios. Beba somente água. E solte logo o copo. Não o fique segurando, não seja fotografado com copo na mão, mesmo que seja refrigerante.


Dê uma forma definitiva ao seu currículo

Seu currículo é sua biografia resumida, a base de sua imagem e o registro de suas credenciais para o cargo que pleiteia. Não é, pois, assunto que se trata com desleixo. Um erro factual pode ser explorado como mentira, como deturpação que lhe favorece ou como evidência de sua falta de credibilidade. Basta lembrar a controvérsia que envolveu Ciro Gomes na eleição presidencial de 2002. Um descuido do candidato fez com que se atribuísse dois ou três anos a mais de frequência à escola pública do que ele efetivamente cursou. Imprudência aparentemente irrelevante. Aparentemente... Explorada por seus adversários, fez com que Ciro tivesse que gastar minutos preciosos do tempo na TV para se explicar.

O currículo para a campanha deve ser elaborado com todo cuidado. Não deve omitir nada de importante - ou os adversários se encarregarão de completá-lo durante a campanha - e não deve estender nenhuma realização além do que efetivamente ocorreu - se você não chegou a terminar aquele curso, embora tenha dele participado intensamente até o fim, não estique esta informação, dizendo que fez o curso. As regras fundamentais são a sinceridade, a verdade e a precisão. Você não está obrigado, entretanto, a dar conta de cada ano de sua vida, tampouco informar itens absolutamente irrelevantes à disputa e ao cargo.


A ida de Lula a São Paulo, a bordo de um pau-de-arara, foi contada pelo atual Presidente nas eleições de 2002

Um currículo é sempre construído com um objetivo em mente. Assim, as realizações que recomendam uma pessoa para um concurso público ou para um emprego numa empresa não são necessariamente as mesmas que vão interessar o eleitor. Sem mentir e distorcer, você deve fazer uma seleção criteriosa de seu passado, valorizando mais aquelas informações que o credenciam para o cargo. O ideal, do ponto de vista eleitoral, é que o currículo contenha uma história na qual obviamente você é o protagonista. Algo que facilite sua identificação com o eleitor e que contenha os atributos de um conto: enredo e personagens capazes de dar consistência a uma narrativa interessante.

Na eleição presidencial de 2002, Lula contou a história de sua vida como uma narrativa dramática - o nascimento em Pernambuco, a viagem no pau-de-arara para São Paulo, os primeiros empregos, o acidente que provocou a perda do dedo, a família que constituiu, a experiência como líder sindical, a batalha para criar o PT, as disputas presidenciais. A história pessoal contada assim é sempre atrativa. As pessoas têm curiosidade sobre a vida de famosos e importantes e a narrativa é uma fórmula que encontra ressonância no eleitor, que com ela está familiarizado desde criança.

Atenção! Se você tem uma história de vida que pode ser apresentada como uma narrativa ou que contenha um episódio que possua tais características, use-a. Vai tornar muito mais fácil a aceitação de sua candidatura pelos eleitores. Mas se você não tem, não invente uma. Forjar uma biografia para favorecê-lo é um ato que o eleitor não perdoa - e que o adversário explora até o seu último limite.


Preparar-se para a eleição é atualizar-se

A atual fase é o momento próprio para você preparar-se para a campanha sob o ângulo intelectual. Nada na política tem evoluído com maior rapidez e profundidade do que a tecnologia da campanha eleitoral. Você precisa tomar conhecimento destas técnicas que estão a seu alcance. Todos, mesmo os políticos mais experientes, têm muito a aprender - e muito mais a reformular - na forma como conduzem suas campanhas.

Não pense que campanha moderna é sinônimo de campanha rica. A campanha moderna está ao alcance de todos, desde que os candidatos se deem ao trabalho de conhecê-la e praticá-la. Pesquisa, estratégia e marketing constituem o núcleo central da campanha moderna. Mais ainda que a campanha rica, a pobre depende da tecnologia para compensar com o cérebro e o coração o que carece de recursos.


A tecnologia dotou as campanhas eleitorais de mecanismos mais precisos na hora de definir estratégias

Produção de material gráfico, mala-direta, o uso do telefone, os próprios e clássicos corpo-a- corpo e porta-a-porta, o rádio, o trabalho de voluntários, a TV, a técnica da segmentação, os meios de adquirir informação confiável, a administração da agenda, os princípios estratégicos e erros mais comuns que se cometem constituem um corpo de conhecimentos sólido - e, em muitos casos, comprovado por pesquisas científicas - que não pode ser ignorado. Todos estes itens e outros mais foram profundamente alterados na tecnologia da moderna campanha eleitoral, com vistas a torná-los mais eficientes e produtivos. Você não vai querer se arrepender por ignorá-los. Esta é a hora certa para se atualizar.

Atenção à estratégia

Neste momento, você se encontra ainda a meses da data da eleição. Se você deu atenção às advertências feitas anteriormente, a algumas providências você já deu andamento - regularização de documentos, das finanças, da condição física, do currículo, do estudo e da atualização. Não se supõe aqui que tudo nessas áreas já está resolvido, mas que estão em andamento. Estudo e atualização, por exemplo, são atividades permanentes. Regularização da documentação às vezes exige mais tempo etc. Portanto, algumas coisas estão feitas e em andamento. É, pois, o momento de começar outras de natureza mais complexa. Começa agora a sua preparação estratégica para a campanha, que se desdobra em:

  • Posicionamento da candidatura
  • Formatação da comunicação publicitária
  • Timing
  • Segmentação do eleitorado
  • Organização do trabalho de campo

Atenção! É imprudente deixar tais questões para mais tarde, já que você dispõe de tempo agora. Mas não incida no erro oposto: o de pretender equacioná-las definitivamente agora. Trata-se de começar as tarefas. Elas demandarão ainda algum tempo para serem finalizadas. Começando agora, você ganha tempo precioso, mas não há como finalizá-las neste momento. Falta ainda a atmosfera política que a maior proximidade da campanha traz, assim como faltam os adversários e, sobretudo, a atenção mais focada e o interesse definido do eleitor pela campanha.


Essas são tarefas, entretanto, que você não conseguirá realizar sozinho. Antes de empreendê-las, você já deve ter constituído o seu estado-maior, isto é, aquelas pessoas cuja confiança, lealdade, experiência e conhecimento as credenciam para assessorá-lo na campanha. A constituição dessse grupo é um desafio a sua capacidade de selecionar as pessoas certas para as funções adequadas. Algumas delas, talvez, já o assessoram há mais tempo. Outras começarão a integrar sua equipe a partir de agora. Devem constituir um grupo capaz de trabalhar bem coletivamente, secundarizando vaidades e interesses individuais pelo objetivo maior de ganhar a eleição.

Campanhas eleitorais costumam atrair egos fortes e afirmativos, líderes nos seus campos específicos de atuação. O reconhecimento do mérito e o prêmio à competência são sempre a aprovação do candidato. Dessa situação decorre um certo grau de competitividade entre os membros que, mantido dentro dos limites fixados pelo objetivo maior de ganhar, é positivo. Extrapolar tais limites, entretanto, tornando-se uma rivalidade pessoal, é altamente destrutivo.

Ciência e arte a serviço da estratégia


A equipe de campanha precisa saber trabalhar coletivamente rumo à vitória

Além do potencial desentendimento entre os membros mais próximos do candidato, há também os fatos de natureza política e estratégica. A definição da estratégia é sempre o resultado da ciência e da arte. A ciência, sobretudo a pesquisa, leva a equipe com segurança,até um certo ponto. A partir dali, é obra da criatividade, da imaginação e do talento. Trata-se de uma criatividade que se erige sobre fundamentos sólidos do conhecimento confiável, mas a formatação final da estratégia, sua linha de comunicação com o eleitor, é obra da arte: da imagem bem escolhida, das frases bem apanhadas; da história narrada de forma atraente; da sintonia com o sentimento do eleitor; do slogan, do jingle e da marca que aderem ao candidato e o identificam para o eleitor; das propostas apresentadas com clareza e persuasão; das cores, do movimento e do ritmo das peças publicitárias.

Por isso, insistimos tanto na capacidade de a equipe saber trabalhar junto, respeitar-se e não permitir jamais que a brilhatura pessoal, a vaidade e a competição interna adquiram mais importância que o objetivo de vencer. A equipe que você vai formar terá seus cientistas (pesquisa), seus teóricos (estrategistas) e seus artistas (publicitários). Todos devem saber quais são seu momento e seu limite. Como regra, o trabalho científico – pesquisa e segmentação do eleitorado - vem antes. Sua tarefa é definir com clareza qual é a mensagem certa para o eleitorado certo. Ou seja, a mensagem da candidatura que corresponde aos sentimentos e prioridades do eleitor - e qual eleitor pode vir a votar em você.

Definida essa questão, a publicidade se encarrega de formatar a mensagem de maneira a dotá-la da capacidade de comunicação. É mediante a propaganda que a mensagem certa chega aos eleitores certos, de forma atraente, envolvente e persuasiva. Esse é um trabalho muito mais da arte que da ciência. A separação da elaboração estratégica entre as duas significa que publicitários podem dar idéias e ter o que dizer sobre as pesquisas, assim como os estrategistas e pesquisadores também sejam ouvidos sobre a comunicação. Se a equipe trabalha bem em grupo, têm-se muito a ganhar com esta fertilização cruzada.

Atenção! A penúltima palavra sobre um campo e outro pertence aos respectivos especialistas. A última palavra deve sempre ser a sua. São cuidados que podem parecer excessivos. Esteja, entretanto, certo de que não o são. Ao contrário, constituem um investimento seguro na eficiência de sua campanha.


Francisco Ferraz

Ninguém está imune aos erros. Nem mesmo os políticos importantes e poderosos

Por ser uma pessoa pública, o político,

sobretudo o governante, deve estar

atento ao fato de que os erros que

pratica, adquirem uma dimensão muito

maior do que no caso de pessoas comuns

Mesmo os políticos mais importantes, experientes e poderosos, cometem erros que, apesar de pequenos, possuem conseqüências desastrosas. Sua experiência, autodisciplina e conhecimento são derrotados, nestes casos, por sentimentos tão comuns como a vaidade, ambição, arrogância, ódio, e outros de natureza semelhante que atingem qualquer mortal. Ocorre que o político, sobretudo o governante, não é qualquer mortal. É uma pessoa pública, e, como tal, os erros que pratica, adquirem uma dimensão muito maior do que no caso de pessoas comuns.

Guerra do Iraque trouxe prejuízos políticos a George W. Bush

Os erros de maiores conseqüências ocorrem em situações de conflito, quando o julgamento fica comprometido pelas emoções, o adversário usa todas as suas armas para derrotar-nos, e as decisões precisam ser tomadas rapidamente, num contexto de informações insuficientes, de incertezas e riscos. Ora, por razões como estas, a relação de conflito na política é a mais incerta de todas as interações. Sabe-se como se entra num conflito, mas é muito difícil saber-se como se sai dele.

Relações de conflito - eleitorais, partidárias, entre grupos sociais, e até guerras - devem ser encaradas com extremo cuidado. Como regra, deve-se refletir muito antes de entrar nelas, avaliar custos e conseqüências em relação aos benefícios trazidos pela eventual vitória, probabilidade de vencer, recursos necessários, e sua disponibilidade, estratégias, entre outras questões. Se, após toda esta reflexão, a decisão for entrar no conflito, então se entra "com tudo". Entra-se para ganhar da maneira mais cabal possível e dentro do menor prazo de tempo.

É sobremaneira decisivo planejar a forma de concluir e sair do conflito, após a vitória. A clássica frase de Pirro é uma advertência perene a todos os que entram num conflito: "Mais uma vitória como esta e estaremos perdidos".

Vitória de Pirro tornou-se aquela na qual as perdas exigidas para vencer, enfraquecem ao invés de fortalecer o vencedor. O objetivo será sempre o de sair do conflito em melhores condições do que aquelas com as quais se entrou. Isto não significa apenas sair vitorioso e conquistar o objetivo, mas, por igual, sair com uma imagem positiva.

O conflito político é sempre público. A opinião pública o acompanha e julga os contendores. Luta-se para conquistar o objetivo, mas luta-se também para conquistar a opinião pública. Para atingir o objetivo de uma vitória cabal, rápida, e aceita pela opinião pública, é fundamental vencer a primeira batalha: "Definir conceitualmente o conflito de maneira a manter opções em aberto para conclui-lo, quando conveniente" .

Um exemplo de erros cometidos por políticos importantes e poderosos nesta questão, foi dado pelo ex-presidente dos Estados Unidos, George W. Bush. Há um erro, em especial, em relação ao qual ele parece ter uma nítida propensão: A maneira radical de definição do conflito e a sua personalização, deixando a si mesmo, e a seu inimigo, sem nenhuma alternativa para concluí-lo pela negociação. Usando a guerra do Iraque como exemplo, podemos identificar os dois conceitos que os adversários propõem para definir o conflito que travam.
Do lado americano e britânico, a guerra foi apresentada como destinada a desarmar o regime iraquiano das armas de destruição em massa, derrubar o regime tirânico de Saddam Hussein, punir o ditador e seus homens de confiança, e reconstruir um Iraque democrático.


Ao personalizar o conflito, Bush deu a Saddam o tamanho do presidente dos Estados Unidos

Do lado iraquiano, a guerra foi apresentada como uma agressão americana e britânica contra o país e seu povo, como uma tentativa de implantar um neocolonialismo - com o objetivo de se apossar das jazidas petrolíferas do Iraque - como um ato de racismo e de hostilidade ao islamismo, e, como a imposição do poder americano sobre o mundo árabe e sobre o mundo em geral.

O ex-presidente Bush, ao mudar os objetivos da guerra - de uma ação destinada a desarmar o Iraque das armas de destruição em massa, para a de derrubar o regime, eliminar Saddam, seus filhos e sua "entourage", ocupar militar, política e economicamente o Iraque após a vitória - definiu o conflito de forma tão radical, que o colocou em confronto não apenas com o Iraque, mas com todo o mundo árabe, e inclusive com seus tradicionais aliados. O mundo passou a temer os EUA. Quem será o próximo país a ser atacado?

A teoria da guerra preventiva - que revoga o princípio da autodeterminação dos povos e o do respeito à soberania nacional - com a qual Bush conceituou a guerra; a frase tantas vezes repetida "quem não está conosco está contra nós"; expressões como "tentativa de decapitar o regime", "Bin Laden vivo ou morto"; tiveram como resultado: a desmoralização da ONU, a exacerbação do ódio dos povos árabes, a retomada das políticas armamentistas, a alienação dos aliados tradicionais, a insegurança internacional e a desconfiança com relação ao governo americano.

Esta forma de conceituar a guerra, livremente escolhida pelos governantes americanos, foi ainda agravada pela sua personalização. Ao fixar como objetivo não negociável a derrubada do regime e a liquidação física de Saddam Hussein, seus filhos e sua "entourage", (como Bush já havia feito em relação a Bin Laden), não deixou outra alternativa a Saddam a não ser usar todos os recursos militares possíveis para reagir ao ataque.

Ao personalizar o conflito "Bush x Saddam" Bush deu a Saddam o tamanho do presidente dos Estados Unidos. Com isso, Saddam se transformou em um líder árabe que conseguiu transcender os limites de seu país. Saddam e sua luta passaram a representar a luta do povo árabe contra os opressores. O Iraque não venceu os países da coalizão na guerra, mas ganhou a batalha da opinião pública.

Cronologia da Guerra do Iraque


A Guerra do Iraque começou em 20 de março de 2003, quando houve o primeiro bombardeio sobre Bagdá

A Guerra do Iraque começou em 20 de março de 2003, quando houve o primeiro bombardeio sobre Bagdá com mísseis Tomahawk com o objetivo de tentar matar Saddam Hussein. Em pouco mais de dois meses, o exército iraquiano foi derrotado. No dia 1º de maio, em um discurso pronunciado no porta-aviões Abraham Lincoln, o presidente dos Estados Unidos, George W. Bush, anunciou o final das operações militares de envergadura no Iraque.

No dia 22 de maio, a ONU adotou a resolução 1483, que acabou com as sanções contra o Iraque, legitimou a presença da Autoridade Provisória da Coalizão, comandada pelos EUA, no governo do país e dá à entidade um papel limitado na reconstrução. Em dezembro, Saddam Hussein foi capturado, escondido em um buraco, próximo a sua cidade natal, Tikrit.

Apesar da onda de violência continuar no páis foram realizadas eleições em 30 de janeiro de 2005. Os grupos xiitas iraquianos saíram vencedores nas eleições. A coalizão Aliança Iraquiana Unida obteve 47,6% ou cerca de 4 milhões dos votos no pleito.

Depois de um longo julgamento, Saddam Hussein foi condenado a morrer na forca por crimes contra a humanidade. O ex-ditador do Iraque foi acusado de ter responsabilidade no massacre, nos anos 80, de 148 camponeses xiitas. Saddam foi executado na forca, no dia 30 de dezembro de 2006, em um dos antigos centros de tortura em Bagdá, quase quatro anos depois de ter sido derrubado pelos Estados Unidos.


Francisco Ferraz

sábado, 15 de maio de 2010

Conhecimento prático, objetivo e apartidário para o dia-a-dia do político

Conselhos úteis para lidar com seus

superiores (II)

Nunca apresente ao seu chefe trabalhos pela metade ou em andamento

A advertência, na verdade, deveria ser mais ampla. Não se apresenta trabalhos pela metade a ninguém, muito menos ao seu chefe.

A situação ocorre pelo conflito que se estabelece entre:


A ansiedade do assessor de querer ser o primeiro a apresentar os resultados ao chefe, pode causar a entrega de trabalhos pela metade

  • A ansiedade de ser o primeiro a apresentar os resultados ao chefe, pelo temor de que, esperando a conclusão, outro auxiliar, mais expedito, o antecipe, apresentando a mesma idéia, descoberta, ou fatos e documentos, antes dele;

  • O sentimento de que deveria antes concluir o trabalho para só depois apresentá-lo.

A política é muito dinâmica, e a rapidez em produzir um trabalho é sempre muito valorizada. O assessor político é sempre lembrado pelo seu chefe de que ele não é um acadêmico, que deve evitar tornar-se um teórico, que deve apresentar suas idéias e sugestões, com objetividade, praticidade e urgência.

Este senso de urgência, provém do próprio político. Ele também está preocupado em não ser ultrapassado por seus concorrentes. Uma boa idéia, uma proposta original, algo que possa ser apresentado como um fato novo, rendem presença forte na mídia, pautam os demais políticos, reforçam sua posição de poder na Casa ou no partido.

Antes de lançá-la à público, o político manda sua assessoria estudá-la, para assegurar-se de que vai apresentar algo consistente, original, impactante. Não pode produzir uma gafe. O sentido de urgência vem do chefe. Ele quer se antecipar aos demais, quer fixar sua autoria, e tirar proveito político só para si. Este sentimento de urgência, qualificado pelas advertências de que não pode haver erro, é transmitido para a assessoria.

Esta, por sua vez, assume a urgência junto com a exigência de precisão e veracidade. A cada dia que passa o assessor é cobrado, de início com tolerância, mas, passado algum tempo, com insistência e impaciência, pelos resultados.

Soma-se a esta impaciência o duplo temor de que, por sua demora os adversários poderão se antecipar (fazendo o político perder aquela chance), ou, os seus colegas de assessoria o superem (fazendo com que ele perca força junto ao chefe comum).
Nestas condições, não é incomum a precipitação. Tão pronto haja algum material em condições de ser apresentado, a tentação de levá-lo ao chefe passa a ser muito grande. O próprio chefe contribui para a precipitação com a sua curiosidade insistente.


O sentimento de pressa de um assessor acabar por levar à entrega de trabalhos incompletos

Apesar de tudo, você deve evitar a precipitação de apresentar (situação do assessor) ou receber (situação do chefe), um trabalho pela metade. Há várias razões que desaconselham esta atitude.

1. Todos os inícios são imprecisos, sem forma definida, e saturados de pressuposições, estimativas, inferências, o que impede uma visão clara, segura e objetiva da questão, ainda que contenha já alguma informacão, idéia ou fato relevante e politicamente rentável;

Em conseqüência, não são suficientemente confiáveis para justificar a sua divulgação, embora o político, de posse daquela idéia, fato ou informação rentável, dificilmente deixará de usá-la, embora de forma parcial. Agindo assim, quando tiver todas as informações na mão, elas já não serão novas, nem terão o mesmo impacto na opinião pública.

2. O aprofundamento do estudo pode revelar erros e imperfeições, que, na pressa em explorar a matéria, não havia ainda descoberto. Dependendo da gravidade deles talvez seja até mesmo desaconselhável a exploração da questão. É mil vezes preferível descobrir esta realidade, no estudo, dentro do sigilo do gabinete, do que descobri-la pela sua invalidação pelos adversários ou pela mídia.

Enquanto a matéria está clausurada no gabinete, não há riscos de desgaste político. Depois que vai para as ruas, o desgaste não mais pode ser evitado.

3. O trabalho pela metade ou em andamento, é importante, alertar não é o trabalho. Ou ele é tudo ou não é nada. Ainda que você sinta que o essencial já está definido, não há nada igual ao trabalho concluído, revisado, e formatado para sua apresentação. Bons mestres, grandes cientistas, são muito cautelosos ao não permitir que suas idéias sejam encaradas como o embrião de algo maior e mais completo.

Nos Estados Unidos, tive um professor que me deixou marcado pelo que ele chamava the perfection of the last inch (A perfeição da última polegada), querendo com isso mostrar que muitos trabalhos bons perdem muito da sua qualidade ao final, por relaxamento, pressa ou cansaço. Assim mesmo, deve-se lutar contra estas tendências para chegar à "perfeição da última polegada".
4. O trabalho pela metade desqualifica seu autor. Ao satisfazer a pressa do chefe, apresentando o trabalho de forma incompleta, seu autor terá deficuldades de responder às questões que o próprio trabalho suscita. Mostrará então uma fragilidade que assusta seu chefe. Será que o uso do material não resultará numa "gafe"?


A impaciência do chefe repercute no assessor que acaba por ser o primeiro a apresentar resultados mesmo que não possuam consistência

Será que aquilo que ele considera seguro, em verdade não é tão seguro assim? Nesta hora o chefe não pensa em quanto ele é responsável pela precipitação, ao apressar, "cobrar", e impacientar-se.

Nesta hora ele fica dominado por uma decepção: ele tem nas mãos um trabalho em andamento, feito pela metade, ainda que promissor, ainda que contenha idéias, fatos e propostas interessantes. A imagem de seu assessor fica comprometida. A sua confiabilidade na capacidade dele, de produzir material para seu uso político, fica profundamente abalada.

Ele passa a ser visto como alguém que quer brilhar a qualquer custo, sendo o primeiro a apresentar resultados que, embora atraentes não possuem a consistência para serem usados; como alguém de julgamento muito deficiente; como um superficial; ou ainda como uma pessoa precipitada.

Como se percebe, é preferível sofrer as cobranças e resistir à impaciência do chefe, do que apresentar trabalho pela metade. Não esqueça nunca, trabalho pela metade não é trabalho. Ou ele é tudo, ou não é nada.

Diante da insistência do chefe você sempre poderá arguir que o está protegendo de entrar numa fria, de cometer uma gafe, e que, a menos que toda a questão seja devidamente esclarecida, você não recomenda que se fale dela.

É óbvio que você deverá sempre, sobretudo quando a matéria está sujeita a um desgaste temporal, tentar combinar rapidez no seu trabalho com precisão. E, se conseguir aprontar seu estudo antes que o previsto, tanto melhor. Mas, se, ao contrário, aquela necessária precisão e segurança demandarem mais tempo, não hesite em pedir mais tempo.

É bom lembrar que, a memória de algo imperfeito, impreciso, e inconcluso perdura na mente de quem o viu, e, mesmo quando, este algo vier a ser apresentado de forma final, aquela memória vai conviver com o produto pronto, sob a forma de desconfianças, dúvidas e incertezas.


Francisco Ferraz

terça-feira, 11 de maio de 2010

O candidato obrigado a vencer

Para alguns, a vitória é só uma questão de tempo. Porém, o excesso de confiança traz dentro de si uma armadilha fatal

Este caso é muito peculiar e paradoxal. Afinal, o senso comum nos diz que, aquele que se candidata busca a vitória. Na realidade, não é bem assim. Há candidatos que se sabem sem chances, e, mesmo assim, dispõem-se a concorrer para ajudar o partido. Seja para conquistar cadeiras no legislativo, seja para marcar a presença do partido, com sua mensagem própria, ou até para preservar espaços políticos que já possui.

Comentaristas políticos criam expectativas no candidado obrigado a vencer ao apontar favoritismos

Mas este não é o caso do candidato que entra na disputa tendo fixado subjetivamente uma obrigação de vencer. A palavra-chave, na caracterização deste tipo de candidato, é "obrigação". Isto é, a eleição é dada por ele como vencida, antes mesmo de começar a campanha. Esta é apenas a trajetória que precisa ser legalmente cumprida para confirmar a sua vitória.

De onde vem esta obrigação? Ela não surge do partido, que sabe ser ela despropositada. Não é criada pelos comentaristas políticos que, com sua experiência, animam-se no máximo a apontar favoritismos. Também não é extraída das pesquisas (sérias) porque indicam tendências, e não são nunca profecias sobre o futuro.

A obrigação de vencer vem da cabeça do candidato, do seu ouvido seletivo (só dá importância às informações favoráveis), do seu preconceito em relação aos demais candidatos, do grupo que constitui em volta de si, já pré-selecionado a partir desta convicção, da família dele que tende a encarar a eleição sempre do ângulo emocional, de sua auto-avaliação, onde aparece como largamente superior, em todos os aspectos aos seus adversários, por vezes de seu ódio contra um adversário em relação ao qual não admite ser derrotado, e, em não poucos casos, tudo isso se concentra numa vaidade pessoal exacerbada.

O candidato obrigado a vencer possui semelhanças com a Seleção Brasileira de Futebol, no período que antecede à Copa do Mundo. A seleção já sai do Brasil embalada no sentimento de vitória antecipada. Não poucas vezes as discussões se concentram em decidir com quem será a final.

A mídia nacional, a posição da seleção no ranking internacional, os comentarios estrangeiros, o clima de excesso de confiança, mal-contido na entrevistas dos jogadores, tudo converge para a criação de um estado de espírito na opinião pública de, mais que confiança, convicção na vitória final da seleção.

Tem-se a impressão que já ganhamos a Copa, embora fiquemos sujeitos a confirmar a vitória nas partidas previstas na tabela de jogos. Quando os fatos não confirmam a expectativa, há sempre algumas desculpas à mão, para provar que, embora merecessemos ganhar, algum acidente imprevisto, injusto e fatal, nos arrebatou a vitória.
"Não ganhamos, mas a vitória moral foi nossa"; "a culpa foi do juiz"; "um problema de última hora vitimou Ronaldinho"; "foram erros do técnico"; para citar algumas das desculpas que têm sido usadas para explicar aquilo que tinha se tornado inexplicável.


O candidato obrigado a vencer possui semelhanças com a Seleção Brasileira de Futebol. Normalmente, a equipe já sai do Brasil embalada no sentimento de vitória antecipada

O candidato obrigado a vencer entra na disputa assim como a Seleção Brasileira entra na Copa: já ganhou, mas infelizmente terá que se sujeitar aos jogos do campeonato ( à campanha eleitoral e ao processo eleitoral).

Se ao final ganhar, não é surpresa. Nada mais fez do que sua obrigação. Se perder, aí sim a surpresa é grande. Logo são necessárias explicações para o absurdo que não ponham em dúvida a natural superioridade.

Não é a seleção que é inferior, assim como não é o candidato que é ruim. Foram fatores imprevisíveis e incontroláveis que provocaram o desastre.

A difícil relação com a realidade

O problema fundamental do candidato obrigado a vencer é a relação que estabelece com a realidade. Não há tolerância para as informações negativas, que são recebidas como erradas, destorcidas ou produtos da má-fé.

Se a pesquisa própria traz informações negativas, é porque foi mal-feita, e o culpado é o Instituto que a fez; se for pesquisa feita por outros, é porque foi manipulada para prejudicá-lo. Em resumo, a única pesquisa que ao final é aceita, é aquela que o traz na frente com substancial vantagem.

A convicção da vitória é tão grande, as expectativas que ela anima são tão fortes, que a campanha se vê forçada a encontrar uma forma padrão de lidar com informações negativas. Na maioria das vezes, este candidato realmente parte de uma condição de favoritismo. No início da campanha, dificilmente vai ocorrer uma reversão súbita deste favoritismo. Nessa fase, então, tende a haver uma razoável consistência entre as expectativas e a realidade.

À medida em que a campanha avança, e os demais candidatos entram em ação aberta e ostensiva, aquela situação de consistência tende a sofrer mudanças. O eleitor, ainda desmobilizado, na fase pré-campanha, começa a se interessar e a acompanhar com maior interesse o jogo político. A programação do horário gratuito na mídia o colocam em contato com todos os candidatos; os debates, as entrevistas, as pesquisas, contribuem para aproximá-lo mais da eleição.

Aquela disposição inicial (que favorecia o candidato) começa a inevitavelmente a mudar, trazendo surpresas desagradáveis para a campanha "obrigada a ganhar". São os que se declaram indecisos, os que, depois de conhecer outros candidatos, mudam de preferência, e, em conseqüência, os índices do candidato favorito tendem a cair. Um exemplo seria a deserção dos eleitores que estavam com ele inicialmente, mais por falta de opções do que por real preferência.
Esta é uma queda normal, para quem larga distanciado na frente. Nestes casos, é muito difícil "segurar" grandes diferenças, e manter-se nos altos patamares, depois de começada a campanha. Normal para quem analisa a eleição com frieza e objetividade. Uma surpresa perturbadora para quem se considera destinado a vencer.


Se o candidato também não se preparar para a derrota será alvo fácil para as presas que habitam a floresta política

A primeira tendência é tratar essas informações negativas como erros, imprecisões, ou no máximo, como oscilações sem maior importância. A continuidade nas informações negativas, passa então a ser vista como uma combinação de manipulação mal-intencionada, por parte dos inimigos, e de incompetência dentro da própria campanha.

A partir do início da segunda metade do tempo de campanha, a impaciência, revolta e inconformidade aumenta, alcançando níveis de conflito e passionalismo muito altos. Se não se verificar algum fator positivo, que dê indícios de reversão daquela tendência, a campanha entra em crise séria.

O candidato passa a agir impulsivamente, perde controles sobre as suas emoções, exige resultados imediatistas, e "abre a temporada de caça aos culpados". Os assessores reagem defensivamente: não mais se atrevem a levar-lhe notícias ruins, ficam inseguros e tímidos, e, obsessivamente, procuram defesas que evidenciem que não é deles a responsabilidade.

Candidatos que se concebem como obrigados a vencer, não têm, usualmente, equipamento psicológico para sair dessa situação. Tendem a afundar-se cada vez mais, já que o mau humor do candidato, sua recém-adquirida insegurança, sua postura de estar sempre se queixando e pondo a culpa nos outros, torna-o menos eficiente no contato com o eleitor, e, portanto, com menos chances de reverter o quadro.

A esses problemas somam-se as críticas, os ataques, o bom desempenho de outros candidatos, e, sobretudo os erros cometidos pelo candidato. A campanha perde ousadia, tende a levar o candidato para contato com aqueles que já o apóiam e, adquire, por fim, uma dinâmica de desconfianças mútuas, de medo, de ressentimento que a paralisa. Perde todas as condições de pensar, planejar, debater e decidir.

Uma campanha montada com a obrigação de vencer não se prepara para a eventualidade da derrota, não sabendo pois, como lidar, em tempo, com as tendências negativas. Espalha-se então, pela floresta política, o cheiro de sangue no ar, assanhando os "predadores" a buscar a vítima ferida.


Francisco Ferraz

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